A forma como alguém saúda ou cumprimenta é bem reveladora da sua educação. Existem regras para a sua execução de acordo com interlocutores e com ocasiões, existindo uma enorme diversidade consoante os costumes culturais.

No que diz respeito a este tema, a pandemia que recentemente assolou o planeta obrigou a alterar profundamente hábitos e costumes estabelecidos há séculos.

Não se trata de uma situação inédita, também durante a peste negra do século XIV e na Gripe Espanhola de 1918 as pessoas tiveram que alterar os seus comportamentos para prevenir contágios.

Na actual crise pandémica, as autoridades de saúde pública mundiais alertaram para o risco de algumas formas de cumprimento, nomeadamente o abraço, o beijo e o aperto de mão, tendo sugerido saudações isentas de contacto físico.

Entretanto, entre os mais relutantes em abdicar do contacto físico, surgiram algumas formas caricatas de interacção. Uns andam às cotoveladas enquanto outros preferem o pontapé.

No entanto, segundo a Organização Mundial de Saúde mesmo as pancadas de braço ou cotovelo devem ser evitadas. Penso que não se pronunciaram sobre o pontapé pelo ridículo da coisa.

As referidas novas formas de interacção têm mais de belicoso do que de pacifista, ao contrário do que acontecia por exemplo com o aperto de mão ou com o beijo.

Na história milenar do gesto do aperto de mão parece estar a representação da resolução de um conflito ou o estabelecimento de um acordo.
Acredita-se que ao estender a mão vazia se pretendia mostrar que não continha arma e o sacudir das mãos era a forma de garantir que a outra pessoa nada tinha escondido na manga.

O beijo era usado como manifestação de fidelidade e também para selar acordos de transferências de propriedades.

Na antiguidade era costume enviar beijos aos deuses. Era também comum o beijo entre guerreiros no retorno dos combates. Consistia numa espécie de prova de reconhecimento.

O aperto de mão e o beijo são na sua essência gestos de afecto, transmissores de boa vontade e de paz.

No actual contexto em que estamos impossibilitados do uso destes belos gestos porquê substituí-los por formas algo grotescas quando existem há milhares de anos outras excelentes formas de saudar e cumprimentar plenas de significado?

Um desses gestos é a saudação hindu de Namaste, que consiste em juntar as palmas das mãos com os dedos apontados para cima, à altura do peito e sob o queixo devendo ser acompanhado de ligeira inclinação da cabeça e do corpo, desde a cintura.

Comum na Índia, Bangladesh, Nepal, Tailândia e outras partes do Sudeste Asiático, este gesto de saudação, considerado um sinal de respeito e gratidão, honra e lisonjeia o interlocutor. Esta é uma saudável saudação plena de simbolismo que transmite uma poderosa mensagem numa altura em que o mundo tanto necessita de solidariedade.

Recomendada pelo director-geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, foi bem recebida por alguns líderes mundiais que optaram já por usar este gesto.

O Príncipe Carlos adoptou-o desde cedo e usa-o frequentemente, nomeadamente fê-lo para saudar os convidados na recente Recepção da Commonwealth.

O Primeiro-Ministro israelita encorajou a população a adoptá-lo a fim de mitigar a propagação do coronavírus.

Também com grande significado é o gesto da colocação da mão direita sobre o coração e ligeira inclinação da cabeça. Para algumas culturas o coração é tido como um símbolo sagrado de grande importância, mais importante que o cérebro.

Considerado o lar da alma, é onde reside a sua vida espiritual. Dessa forma tocar no coração é um gesto considerado quase sagrado que significa: que a paz esteja convosco.

Recentemente o embaixador da Suécia no Kosovo saudou com este gesto as pessoas presentes numa cerimónia.

Gesto com idêntico significado é o da colocação de ambas as mãos no peito.

Também sem contacto físico e demonstradora de grande respeito, a forma tradicional chinesa de saudar e agradecer, consiste em envolver uma mão com a outra à altura do peito e acompanhar com inclinação da cabeça.

A vénia japonesa constitui uma reverência ou gesto de deferência. Iniciada como um costume exclusivo da nobreza há mais de mil anos, é hoje a saudação não verbal mais difundida no Japão.

A curvatura do corpo a partir dos quadris e o baixar da cabeça transmitem respeito. O grau de inclinação exprime uma mensagem.

Com os pés juntos, as mulheres com as mãos sobrepostas, na frente e os homens ao lado das pernas, faz-se curvando o corpo a partir dos quadris e mantendo o tronco bem direito.

A vénia com inclinação de 15º, Eshaku, é normalmente usada para situações do quotidiano, tais como saudações, por exemplo, para agradecer ao sair de um restaurante.

A vénia com inclinação de 30º, Keirei, emprega-se durante as apresentações e outras formalidades. Usa-se também para cumprimentar os amigos e familiares.

A vénia com inclinação de 45º, Saikeirei, a mais cerimoniosa, deve ser usada nos primeiros encontros e com pessoas de alto estatuto. Esta demonstração de profundo respeito é também usada frequentemente para apresentação de desculpas.

Vimos que a inclinação da cabeça integra diversas formas de saudação ou cumprimento de outras culturas, mas não devemos esquecer que este gesto faz também parte da cultura ocidental. Habitual entre pessoas de educação especialmente esmerada são diversas as situações em que se aplica. Isoladamente, deve usar-se como saudação e sinal de respeito em cerimónias ou para saudar pessoas a quem não se foi apresentado ou acompanhando um aperto de mão (não actualmente) a alguém a quem se está a ser apresentado ou a alguém a quem se deve grande deferência.

Nas actuais circunstâncias, mesmo com familiares e amigos podemos fazer este gesto naturalmente acompanhado pelas habituais expressões: “Como estás?”, “Como passam?” ou outras palavras de cortesia.

Todas estas formas tradicionais de saudação provenientes de diferentes culturas, mas que têm em comum a ausência de contacto físico, representam comportamentos higiénicos que integram a intenção de cuidar do bem-estar comum e revelam respeito e afeição.

Que a epidemia que estamos a viver nos traga mais humanidade e nos ajude a eliminar estereótipos e a criar pontes!

Manuel Pereira de Melo

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