As missões oficiais e empresariais a outros países destinam-se a divulgar as potencialidades do país que visita e a potencializar a criação de parcerias entre instituições e empresas de ambos. Naturalmente estas deslocações envolvem despesas elevadíssimas.

Há alguns anos atrás, integrei a comitiva empresarial de uma missão oficial a um país da América Latina. No dia em que chegámos fecharam três dos principais bancos.

No dia previsto para a realização de encontros entre as empresas portuguesas e as empresas locais, nem uma só destas compareceu. O país estava mergulhado numa profunda crise e a missão portuguesa regressou sem que se realizassem quaisquer acordos ou negócios.

As entidades oficiais portuguesas mostraram que não fizeram o trabalho que lhes competia. Não estudaram a real situação do país com que pretendiam aprofundar relacionamentos nem avaliaram o momento para o fazer. À boa maneira portuguesa, foi tudo feito “em cima do joelho”.

Muitos anos mais tarde foi realizada uma missão a um país asiático.

Como é sabido, as culturas divergem muito de continente para continente, de país para país e até dentro de um país, de região para região. Antes de uma deslocação a um país deve haver a preocupação de estudar atentamente os costumes locais para os saber respeitar e proceder de acordo com os mesmos.

A cultura dos países asiáticos é profundamente diferente da portuguesa. Embora não tenha integrado a missão pude acompanhar à distância os acontecimentos através de um dos empresários participantes. A missão revelou-se um malogro porque ninguém, entidades oficiais ou empresários, se preparou devidamente para saber negociar e lidar com as especificidades da cultura local. Uma vez mais não houve a devida preparação. À boa maneira portuguesa, improvisou-se e correu mal.

Isto nunca teria acontecido com missões alemãs, dinamarquesas, americanas, japonesas e muitas outras.

Onde será que reside o sucesso das economias mais dinâmicas e avançadas? Será apenas nas competências técnicas dos seus profissionais? Naturalmente são vários os factores, mas em grande parte o sucesso reside no desempenho altamente eficiente dos seus profissionais, fruto de uma cuidada formação pessoal.

E que formação pessoal é essa?

É aquela em que se desenvolvem as competências para saber o que fazer, quando fazer e como fazer. É a formação que indica os preceitos que definem as posturas e os comportamentos adequados a cada ocasião. E quem lida com intervenientes internacionais tem que conhecer e saber colocar em prática os preceitos exigidos pelas culturas respectivas.

Tudo isto contempla matéria das boas maneiras, da cortesia, enfim, da civilidade. Em determinado âmbito contempla já matéria de protocolo. Em última instância e de forma mais geral, trata-se de educação!

Em muitos países, de onde se destacam o Japão (cujo povo é considerado o mais bem-educado do planeta), muitos europeus e de outras paragens, as crianças são desde cedo preparadas segundo um forte conceito de cumprimento de deveres, de respeito e amabilidade – as boas maneiras e a cortesia, portanto.

Este trabalho, que naturalmente é obrigação dos pais, é complementado de forma notável nas escolas. As universidades prosseguem esta responsabilidade introduzindo a matéria do protocolo, sendo frequente entrar-se no mercado de trabalho já com preparação nesta área. As empresas, por sua vez, que encaram a formação pessoal dos seus quadros como um investimento e não como uma despesa, promovem de forma contínua formação em protocolo.

O interesse pessoal neste tipo de formação também é revelador. Nos EUA existem milhares de escolas de protocolo. Algumas são especializadas, por exemplo, apenas em protocolo chinês. Os americanos, que não são conhecidos por serem amadores, conhecem o potencial do mercado chinês. Estudam-no seriamente porque sabem que, quem quiser entrar naquele mercado, tem que conhecer profundamente a sua cultura, a sua forma de pensar, de negociar, de se relacionar e agir de acordo com os seus preceitos.

Também na China é grande a preocupação com os conhecimentos de protocolo. Segundo a revista TIME, o curso mais procurado no Instituto de comércio externo de Shanghai é o de protocolo. Gastaria páginas se fosse mencionar todos os países em que o protocolo é considerado matéria fundamental na formação pessoal. Vou apenas referir o caso dos nossos vizinhos espanhóis que há muito possuem dezenas de escolas de protocolo, algumas integradas no ensino superior.

Em Portugal não há uma só. E não há porque não há interesse. Não há interesse de uma grande parte das empresas que consideram a formação, principalmente nesta área, um dispêndio e não um investimento. Pelos mesmos motivos, muitas das universidades também nada fazem.

No que ao interesse pessoal diz respeito, também é praticamente inexistente. Por um lado, por ignorância, muita gente nem sabe o que é protocolo, por outro lado há muito quem ache que não precisa.

Como dizia Amos Bronson Alcott “Ignorar a própria ignorância é a doença do ignorante”.

Este país que acha que não precisa de aprender é aquele em que ainda muita gente cospe para o chão, em que as ruas estão imundas de lixo, em que raras são as pessoas que seguram a porta para as outras, em que, com a maior naturalidade, se chega atrasado ou se paga muito depois do devido, em que muita gente se espreguiça e boceja a cada momento, em que muita gente ainda come de boca aberta ou palita os dentes em público, em que as mesas de refeição estão pejadas de óculos, chaves e principalmente telemóveis, em que se usa o telemóvel à mesa como se tratasse de mais um talher, em que não há pejo com os sons estridentes e incomodativos dos telemóveis, em que as palavras por favor, obrigado e desculpe raramente são proferidas, em que se adula quem vem de fora mas se insulta e ameaça o vizinho à mínima questão, em que poucos são os que sabem agir de acordo com os códigos do comportamento profissional, em que honra e ética são palavras estranhas para muitos.

Os países que apostam na educação são também aqueles que apresentam melhor nível e qualidade de vida.

Não há coincidências!

Manuel Pereira de Melo

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