“Prepara-te para trabalhar e ter muita paciência” foram as palavras do Anselmo Mendes quando, no início dos anos 90, após conhecer a minha propriedade em Santa Comba Dão, me desafiou para a produção de um grande Dão.

Quisemos produzir um vinho de grande complexidade e elegância, que revelasse aromas subtis e complexos, que fosse intenso, mas que apresentasse uma estrutura delicada na boca. Pretendíamos também longevidade e capacidade de envelhecimento, característica que distingue os grandes vinhos.

Naquela época a vinha foi reestruturada e só em 2004 o Anselmo Mendes considerou que estavam reunidas as condições para a primeira colheita.  Com os estágios em inox, madeira e garrafa a que foi sujeito, o Primado 2004 só começaria a ser comercializado em 2008. Apesar dos quatro anos de diferentes estágios e da ansiedade em apresentar o Primado, sei hoje que devíamos ter sabido esperar mais alguns anos. Este Primado 2004 está ainda agora com uma frescura extraordinária e a evoluir de forma notável.

A Patrícia Santos que, entretanto, passou a integrar o projecto, desde logo mostra ser também adepta de saber esperar pelos vinhos. Assim, o momento de apresentar o Primado ao mercado é sempre fruto de profunda reflexão.

O tempo constitui o grande teste para qualquer vinho. Com o tempo um grande vinho evolui adquirindo maior complexidade e revelando atributos que o tornam magnífico.

Independentemente de outros estágios, o estágio em garrafa é fundamental para uma boa evolução do vinho. Se o vinho é colocado no mercado antes de ter atingido o seu ponto ideal de consumo está a transferir-se para o consumidor uma responsabilidade que deve ser do produtor, a de cuidar do estágio do vinho. Quem adquire o vinho vai provavelmente consumi-lo antes do momento certo perdendo assim uma boa parte do seu potencial.

Colocar no mercado num momento adequado estes vinhos especiais, por vezes muitos anos após a sua colheita, cerca de 7 a 8 anos no caso do Primado tinto, tem custos muito elevados para o produtor. Apesar disso, continuamos a fazê-lo porque acreditamos que é a atitude correcta para com o consumidor.

Em Setembro de 2017, realizámos no Palácio do Freixo uma prova vertical de Primado tinto com as colheitas comercializadas, 2004, 2005, 2007, 2009 e 2010).

“Quero voltar a provar estes vinhos daqui por dez ou quinze anos, ainda vão estar extraordinários!” é apenas um exemplo das opiniões proferidas pelos presentes, nomeadamente algumas das principais personalidades do mundo do vinho, que ressaltavam a elegância e a longevidade dos vinhos.

Os grandes vinhos necessitam de tempo, os seus produtores de paciência!

Manuel Pereira de Melo

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